Resenha: Americanah

Americanah 
Autor: Chimamanda Ngozi Adichie
Editora: Companhia das letras
Categoria: Literatura estrangeira
Páginas: 516
Lançamento: 2014

Americanah é o mais recente romance de Chimamanda Ngozi Adichie, publicado em 2013 e lançado em 2014 no Brasil. O livro, a partir da história de dois adolescentes nigerianos, aborda temas que envolvem preconceito racial, desigualdade social e de gênero e imigração. Em outras palavras, Chimamanda Adichie consegue descrever de maneira simples, articulada e intrigante, tudo aquilo que a academia vem tentando teorizar a respeito das relações raciais e dos marcadores sociais da diferença nos tempos atuais. 

A protagonista, Ifemelu, é uma menina de classe média pobre da Nigéria que desperta o interesse de Obinze, filho de professora universitária, pela paixão compartilhada de ambos pela literatura. O romance vivenciado por eles carrega mais do que afinidades comuns, amizade e paixão, mas também o compartilhamento de uma cumplicidade e entendimento de mundo em sintonia.

A trama se desenvolve com a narrativa da trajetória de vida que o casal assume ao ingressar à universidade, assumindo caminhos distintos. De um lado, Ifemelu muda-se para aos Estados Unidos da América, país em que viverá por mais de dez anos, como alternativa as universidades da Nigéria que estão paralisadas devido às sucessivas greves. De outro, Obinze viaja para a Inglaterra e enfrenta diversos percalços enquanto imigrante ilegal. 

Nos EUA, Ifemelu irá se descobrir enquanto mulher, negra, africana e imigrante. Suas experiências em variadas cidades, empregos, universidades, namoros e demais relações de seu cotidiano a impulsiona a criar um blog relatando suas observações sobre tudo aquilo que vivencia de maneira crítica, sincera e irônica. 

Aliás, a ironia se faz presente durante todo o livro, a começar pelo título. Americanah trata-se de uma brincadeira feita pelas amigas de Ifemelu ao se referir a uma colega que havia ido aos EUA, durante um breve período, e que, ao retornar falava com um sotaque arrastado que deixava claro que estivera fora do país, fingindo não compreender mais a língua de seu grupo étnico da Nigéria. Uma irônica provocação em relação a quem que viaja aos EUA e volta se portando como gringa ou “americanah”. 

O romance acaba sendo pano de fundo de uma série de temáticas importantes que são abordadas de maneira natural e prazerosa no decorrer do livro. O blog de Ifemelu coloca o dedo na ferida no que os norte-americanos evitam a todo custo mencionar: a desigualdade racial.  Ela faz do blog uma maneira de gritar ao mundo os preconceitos vivenciados por sua cor, seu cabelo, seu corpo, seu sotaque e seu país de origem.

“O único motivo pelo qual você diz que raça nunca foi um problema é porque queria que não fosse. Nós todos queríamos que não fosse. Mas isso é uma mentira. Eu sou de um país onde raça não é um problema; eu não pensava em mim mesma como negra e só me tornei negra quando vim para os Estados Unidos”

Fica difícil não se envolver com os dramas vivenciados pela protagonista da história. Ifemelu transmite uma liberdade apaixonante, tanto na sua relação enquanto mulher, priorizando seus sentimentos, angústias e desejos, como em sua externalidade com o mundo e com as pessoas com quem convive, cuja sinceridade beira a inocência. Seus erros, equívocos e arrependimentos a tornam mais próxima, real e de carne e osso. Não é uma heroína, mas uma mulher marcada pela experiência racial cujo olhar capta deslizes, sentimentos e injustiças de nossa sociedade.

Compreender o emaranhado de relações que envolve ser uma mulher, negra, africana, universitária, em um país como os EUA não é tarefa fácil e, apenas com um olhar contextual, é possível ampliar nossa dimensão das diferentes experiências marcadas ora de forma subalterna ou privilegiada. Uma ótima opção de leitura que nos desloca de nossos espaços estabelecidos por problematizar situações aparentemente simples mas complexas de significados.